Dúvidas sobre sociedade

Sociedade, seja lá com familiares, amigos ou estranhos, é uma loteria sem igual. E é parecido com casamento (e casamentos acabam mal aos montes, mas nem por isso deixamos de nos casar, certo?!).

Por mais que conheçamos o futuro sócio (seja amigo, esposa, marido, filho, etc.), não sabemos como este se comporta no dia a dia de um negócio. E as pessoas se comportam de forma diferente quando atuam em papéis diferentes. Em outras palavras, uma esposa maravilhosa pode ser um pesadelo como sócia e o mesmo vale para o melhor amigo. Pior, nem nós sabemos como funcionamos no dia a dia de uma sociedade até que experimentemos esta situação.

Ser sócio de alguém numa empresa que está começando é um tremendo desafio. Juntar-se a um sócio e comprar um negócio que já existe há tempos é duas vezes mais complicado, porque você nunca tem certeza dos problemas que vai encontrar.

Agora, entrar na sociedade de uma empresa que já tem um dono há anos é três vezes mais complicado. Vamos aos detalhes:

  • Assim como acontece acima, você nunca sabe o real estado da empresa. Ela pode ter dívidas (fiscais, trabalhistas, bancárias, com ex-sócios, locador, fornecedores, etc.). Ela pode estar dando prejuízo ou lucrando menos do que lhe foi contado. A lista de encrencas possíveis é longa.
  • No lado da administração, do dia a dia, o atual dono já tem seu jeito de tocar o negócio – isto é aquilo que chamamos de “vícios”. E aí vem o sócio novato com suas ideias, querendo dar palpite na produção ou na forma de vender. Pior, pode desconfiar que algo está errado na administração e querer entender melhor as coisas. O risco do sócio fundador se ofender e o clima entre os dois azedar é gigantesco.

Em suma, então eu sou contra que alguém se associe a alguém que já é dono de uma empresa há vários anos? Não, mas é preciso apontar todos os pontos complicados deste caso, para que se reflita e tome a melhor decisão.

Reflexões:

1. Você leva jeito para empreender? Tem tolerância para incerteza e risco? Emprego é chato, mas o salário tende a pingar na conta corrente todo mês, chova ou faça sol. Quando se empreende, a entrada de caixa é uma suposição enquanto as despesas a pagar são uma certeza.

2. Você convive bem com a divisão de poder? Por exemplo, em casa, com seus irmãos ou marido/esposa. Se você tem esta tendência de querer mandar em tudo ou gosta de ter o seu ponto de vista sempre vitorioso…é melhor não ter sócios! A mesma preocupação vale para a situação oposta: pessoas pacatas demais (ou omissas, que é pior…) também não devem ter sócios, pois tendem a ser lesadas, uma vez que deixam tudo na mão do outro…

3. “Sócio chefe”: é o caso típico de quando nos associamos a alguém que já toca um negócio há anos e, ainda por cima, quando entramos como minoritários, i.e. o sócio antigo tem mais ações do que o sócio novato. No fim das contas, ele manda mais que você, o que gera a mais indigesta das situações: você não é empregado da empresa, mas tem um chefe. Tem que ter flexibilidade, jogo de cintura (e estômago) para conviver com isso.

4. As personalidades – o jeito de ser, os valores pessoais – batem? Se você é um de jeito e o sócio é de outro muito diferente, as chances de sucesso são mínimas, salvo se houver muita maturidade entre as partes, para entender que a complementaridade é boa para os negócios. Mas se forem dois machos alfa (http://pt.wikipedia.org/wiki/Alfa_(biologia), as chances são bem pequenas mesmo…

Antes de fechar negócio, faça o seguinte:

1. Seja de uma franqueza irritante – quase ofensiva – com seu futuro sócio…afinal, se houver problema é melhor que ele se torne um futuro ex agora! Deixe bem claro o que você tolera e, principalmente, o que não tolera no dia a dia de uma relação profissional. Exemplo: “Sou super certinho e não tolero gente desorganizada e…” – ou vice-versa. Demonstre claramente suas forças e suas fraquezas – e pergunte as dele -, pois todo ser humano detesta surpresas negativas e ter suas expectativas frustradas.

2. Faça um due-diligence profissional! Este termo ‘chic’ é frequentemente usado nas operações de fusões e aquisições de grandes empresas, mas serve para negócios de qualquer porte. É como se fosse uma auditoria e significa o seguinte: você precisa pesquisar a vida da empresa e do seu sócio e descobrir se ambos têm dívidas que possam estrepar a sua vida por tabela! Recomendo que você use um advogado amigo ou um contador (igualmente amigo) para esta tarefa. Se grandes bancos e grandes empresas utilizam-se destes serviços, recomendo que você não tente fazer tudo sozinho…Aproveite para pedir relatórios internos sobre o faturamento, as despesas, os planos de investimentos que ele possa ter, etc. Enfim, saiba da história e dos projetos futuros.

3. Governança: este outro termo moderninho do mundo dos negócios significa que você deve combinar – em detalhes – com o seu futuro sócio como será a gestão do negócio após a sua entrada. Exemplos: quem aprova as despesas, quem tem poder para tomar dívidas, como se discute os resultados mensais da empresa, como e com qual frequência os sócios podem fazer retiradas, etc., etc. A lista pode ser longa e eu sugiro que vocês a detalhem…para evitar aborrecimentos futuros!

4. Faça suas contas direitinho, não enfie toda sua poupança num negócio desconhecido, correndo o risco de perder considerável parte dela se as coisas não funcionarem direito. Depois que se enfia a grana numa sociedade que tem problema (ou que venha a ter problemas) fica muito difícil recuperar alguma coisa no curto-prazo.

Concluindo, o bom de se entrar num negócio que já existe e que vai (aparentemente!) bem é que o risco inicial foi corrido por outra pessoa a e que as imensas barreiras iniciais foram superadas. O lado ruim é todo o resto, que espero ter abordado acima.

Deixe um comentário

Crie um site como este com o WordPress.com
Comece agora